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segunda-feira, 29 de julho de 2013

Cronicas da Vida.

A vida vagava vagarosamente pelos caminhos do devir, seguia seus afetos abertamente como quem não se preocupa em morder e ser mordido, por tanto que não encontre o seu fim. A vida seguia o seu curso, descarregava os seus afetos de muitas formas. Mas seguia tão somente vida, solitária vida. Não se podia dizer que esta pudesse fazer algo mais extraordinário do que a si própria. Mas nada podia prever os acontecimentos daquela época onde a vida encontrava-se vagando pelos campos. Enquanto dormia, a vida recebeu tamanha pancada na cabeça, súbita! Uma rachadura enorme se fez e o gosto da sua negação veio-lhe logo a boca como a mais infame provocação. Atordoada, a vida não reagiu. Recobrando os sentidos viu as sobras, entre as lágrimas e sangue em seus olhos, do seu detrator. Correu o quanto pôde, cambaleante e sem rumo por tortuosos caminhos. A pancada fora dada com tanto empenho que o que antes, depois de uns goles d’aguas, a evidencia dos afetos para com o perigo si quer haveria deixado qualquer impressão. Mas essa pancada foi diferente, pois além de ainda doer latentemente, represava os afetos não descarregados. O susto da surpresa não expurgou o calor gerado pelo ataque sorrateiro do acaso, mas deixou o organismo em brasa, marcado por algo que permanecia. A vida queimava em delírios, imagens de sombra que doíam como a rachadura em sua cabeça. A sensação dolorosa de que fora rasgado do meio, fracionado. A vida que até ali se podia gabar por ser extraordinária em si, ainda que solitária, agora sentia que algo fora tirado dela. Sentia-se menos do que era e num absurdo ato de pura auto dissidência, pega qualquer lasca de pedra e retribui a mesma injuria sofrida ao vento, na tola tentativa de descarregar seus afetos nos flashs, traços reconhecíveis de seu inquisidor. A ira sofrida é respondida por um ódio tardio e por instantes a pedra risca as paredes de um esconderijo. Algo fabuloso e terrível aconteceu. A vida marcou em si mesma uma lembrança fora dela. O ódio se represou na nascente ideia de vingança/reparação que aquele profundo traço cunhado ao pleno desespero representava. A ideia é do outro. A representação é de si. Agora a vida podia servir-se da arte para nunca mais se esquecer da cobrança por reparação. O outro pagará e a vida será restituída em sua completude. Desde então a vida nunca mais foi sozinha, estava sempre acompanhada de sua falta, do que lhe foi tirado e que agora lhe acomete tanta dor.